Os olhos tristes da fita
Rodando no gravador.
Uma moça cosendo roupa
Com a linha do Equador.
E a voz da Santa dizendo:
- O que é que eu tô fazendo
Cá em cima desse andor?
A tinta pinta o asfalto,
Enfeita a alma motorista.
É a cor na cor da cidade,
Batom no lábio nortista.
O olhar vê tons tão sudestes
E o beijo que vós me nordestes
Arranha céu da boca paulista.
Cadeiras elétricas da baiana,
Sentença que o turista cheire.
E os sem amor, os sem teto
Os sem paixão, sem alqueire
No peito dos sem peito uma seta,
E a cigana analfabeta
Lendo a mão de Paulo Freire.
A contenteza do triste,
Tristezura do contente.
Vozes de faca cortando
Como o riso da serpente.
São sons de sins, não contudo
Pé quebrado, verso mudo
Grito no hospital da gente.
(Beradêro - Chico César)
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