sexta-feira, maio 11, 2012

Elegia À Senhora.

Não há em ti, Senhora, senão calmaria e parcimônia.
Tua pele já não guarda a festividade da juventude.
Também não há em teus olhares a curiosidade
E a pressa, características das mais novas, 
Que acabam de descobrir sorrisos incastos
                                          [e veleidades todas.
Tua boca, Senhora, plangente e misericordiosa,
Abriga um afeto não dito, receoso e murmurante.
Te aninhas no cansaço do dia e sonhas, talvez,
Com alguma bobagem romântica. 
Mas teu corpo, Senhora, se me permites dizer-lhe,
Recende amor maduro, talvez já colhido tantas vezes
Nos anos em que caminhaste errante pelas sendas
Da vida, pelas bocas de uns homens, pelo sexo 
Marcado e o prazer. 
Quisera, Mulher, dar-te uns versos pobres, 
A ti que não verei nunca mais. 
Na lembrança que carrego de ti, olhos, boca 
E também teus cabelos, dourados como
Os planos dos que ainda vivem,
Cantarei secretamente meu solene verso atrasado:
Pois vieste ao mundo, Senhora, e não fui eu quem
                                [te acolheu quando choravas. 
Também não recebi de tua boca a notícia
Do amor, Senhora, dito em tantas ocasiões
                                       [a tantos outros homens.
Mas nada te pediria que não fosse apenas
Os eflúvios da consolação, teu colo paciente
E uma mordida dessa tua fruta, Senhora,
Para o coração machucado de Tempo¹



¹Hilda Hilst.Verso da estrofe IX, contido em Da Noite(1992).